APRENDI COM 2020: O UNIVERSO EM CADA UM DE NÓS
Esse é o terceiro texto da série “O que aprendi em 2020?”, clique aqui se você quiser ler o primeiro e o segundo texto da série.
Nossas interações mudaram muito no ano de 2020. A minha em especial.
Passei o ano de 2019 todo desempregada, então as horas corriam de uma forma diferente. Não tinha correria, não saía muito, não tinha que lidar frequentemente com outras pessoas que não fossem as que sempre convivi dentro de casa – para uma introvertida, isso pode ser muito cômodo e abrir uma espécie de buraco social que faz a gente se acomodar a não interagir mais que o necessário.
Então, graças a Deus, consegui um emprego em 2020 e a rotina deu uma leve enlouquecida, acompanhada de várias novas interações vindo em minha direção. Logo em seguida, o ano deu uma guinada e logo a rotina e as interações mudaram de direção de novo.
Foi tudo muito rápido pra mim, comecei a trabalhar em uma semana e o lockdown aconteceu na semana seguinte. Tive que me aproximar dos meus novos colegas de trabalho com interações limitadas pelo celular e reuniões periódicas de vídeo. Não pude mais ver os alunos que tinha acabado de conhecer. Tive que me adaptar ao novo ambiente e às novas pessoas de uma forma completamente diferente das outras pessoas que entraram antes de mim.
Esse distanciamento pode nos levar à dois caminhos: o do egocentrismo ou da empatia. O primeiro é, infelizmente, mais fácil.
É muito mais fácil, ao estarmos distantes uns dos outros, fechar os olhos para as necessidades das outras pessoas e vermos apenas as nossas. Cercados apenas de nossas vivências, ouvindo apenas nossa própria opinião, nossas limitações, dificuldades, nossos problemas, preocupados apenas com os nossos familiares e amigos. Por isso houve discussões de trabalho, cobranças excessivas em diversos setores, cancelamento pra tudo que é lado.
Mas, especialmente na situação atípica em que estamos vivendo, que o egocentrismo fosse extinto e aprendêssemos a olhar e nos preocupar com o próximo se fez extremamente necessário. Os mais saudáveis precisaram se preocupar com aqueles que eram grupo de risco, os que podiam sair precisaram olhar para aqueles que não podiam.
Na internet, vários testemunhos de pessoas que se ofereceram para sair no lugar de pessoas que eram grupo de risco e não podiam sair. Outras, se mobilizaram financeiramente para ajudar pessoas que estavam com dificuldade. Ou seja, felizmente, muitos conseguimos sair dessa para um caminho de empatia.
Foi difícil para mim a princípio. O medo torna a gente um pouquinho egoísta.
Trabalhando em escola, a instituição não parou. Tivemos entrega de atividade impressa, matrículas, rematrículas, e vários outros procedimentos acontecendo na secretaria, a equipe reduzida por conta da pandemia, principalmente porque muitos são grupo de risco, mas a escola não podia parar.
Sempre me vi como uma pessoa empática, mas parte de mim, não queria tomar isso como um problema meu. Parte de mim queria ficar em casa, onde era mais seguro, e as outras pessoas que se virassem.
Mas, felizmente, consegui enxergar o universo em cada um de nós.
Aprendi, aos poucos, a ver em cada um dos meus colegas de trabalho, um lar a ser cuidado, uma família a ser preservada, um universo de situações que eu só podia apenas imaginar. Na situação que vivemos esse ano especialmente, tivemos que aprender a ver o outro com mais atenção. Estava todo mundo vivendo a mesma pandemia, as mesmas dificuldades, e ao mesmo tempo realidades e situações diferentes.
Cada um conhece apenas seu próprio universo e isso deve ser o suficiente para que tenhamos a sensibilidade de reconhecer que não podemos presumir nada sobre ninguém. Não podemos nem imaginar o que realmente se passa no interior do outro, só nos resta então ser solidários.
Esse ano, mais do que nunca, aprendi a ver isso. E fui vista dessa forma também.
Outra forma de ter interações empáticas que aprendi esse ano foi em relação aos meus amigos. Nem sempre eles estavam bem para mandar mensagem, conversar, estar disposto a interagir pelo celular. Esse ano causou uma carga pesada no ombro das pessoas e ser solidário à forma como elas estavam se sentindo - tanto as mais distantes, quanto às mais próximas de nós - faz com que a gente possa viver relacionamentos mais saudáveis. Todos são merecedores de um olhar empático, só precisamos aprender a reconhecer isso.
O ano – e a pandemia – ainda não acabou e ainda temos tanto a avançar. Muitas pessoas ainda não aprenderam a respeitar os universos vizinhos, mas estou terminando esse ano acreditando que existem pessoas empáticas por aí, pessoas que merecem empatia, e que depende de mim começar essa corrente de respeito e solidariedade entre minhas interações.
Não pude estar vinte e quatro horas perto das pessoas esse ano, mas pude ter meu coração perto delas, me doar como podia. Me preocupar com elas como gostaria que elas se preocupassem comigo. É claro que nem sempre essa atitude será recíproca, mas sou apenas responsável pela forma como eu afeto o universo que é o outro, meu próximo, e deve ser minha escolha olhá-lo com respeito.
Acredito que de muitas formas o distanciamento não conseguiu nos distanciar, apenas aproximar, e a empatia que floresceu no peito de muitos é a prova disso. É uma lição que quero carregar para todos os outros anos que vierem, e que a cada universo que a empatia tocar, mais e mais ela venha florescer dentro de cada um de nós.
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